Lá estava eu, mais uma vez desiludida comigo. Não consegui meditar. Apareceram pensamentos atrás de pensamentos, estranhamente envolvidos numa teia sem início nem fim… histórias elaboradas sem grande sentido, parecia um filme….. ”Meditação não é para mim!”, pensei. Estava com dores no corpo, principalmente nas costas. Tinham sido 10 minutos! Só 10 minutos e eu achei que o melhor era desistir e encontrar outra atividade qualquer que me pudesse ajudar com a minha ansiedade. Ou talvez mesmo fosse mesmo melhor ir à farmácia com a receita que o médico me tinha passado.. Não estava a ganhar nada com a aquilo. Estava só a ficar irritada por não conseguir praticar.
Mas, algum tempo depois daquele momento, encontrei-me com o Mindfulness e alguns ensinamentos novos… e finalmente percebi. Não tinha de não pensar nada. O problema não eram os pensamentos. Era a forma como eu me relacionava com eles. E lá continuei. E continuei. Algumas vezes mais irrequieta que outras, mais presente que outras, mas persistente. E assim continuei.
Noutro dia estava a dar um workshop sobre Mindfulness e como sempre houve pessoas que disseram que já experimentaram e que não sabiam fazer, que era difícil e que não era bem para elas. Houve também pessoas a questionarem como funciona e quais os benefícios específicos. Tenho sempre algum receio em falar sobre estas coisas pois sinto que condicionam imenso a prática, de uma forma que não é benéfica. A prática de Mindfulness não é uma dieta ou um programa no ginásio. É muito, muito mais que isso…
Bom, primeiro é preciso referir que não se medita bem, nem se medita mal. Medita-se. E umas vezes é de uma forma, outras vezes de outra. Torna-se mais fácil com a prática e mesmo assim haverá sempre alturas mais desafiantes. E está tudo bem.
Quanto ao funcionamento. Muito resumidamente, a meditação e a prática do Mindfulness ”funcionam” por causa da forma como afetam e transformam o funcionamento do cérebro, ajudando a criar novos circuitos. Os novos estímulos que acontecem através da meditação aumentam o tamanho do córtex, a massa cinzenta (que é onde acontecem as ligações neuronais da organização cognitiva do cérebro) através da ativação e sincronização de todas as zonas cerebrais. O cérebro esquerdo abranda (a parte mais racional) e o cérebro direito é ativado (a parte mais intuitiva e sensível, com uma percepção mais global). Cada vez que meditamos este processo acontece. É como se estivéssemos a treinar um músculo. E com cada cada meditação, cada vez que nos lembramos de praticar Mindfulness estamos a fortalecer esse músculo. A prática torna-se cada vez mais natural. E é este processo, que faz com que existam tantos benefícios.
Se ainda queres saber dos benefícios… quero-te antes falar em ”efeitos secundários”. Então, olha para esta lista bem impressionante:
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redução de stress e ansiedade
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mais compaixão e empatia
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redução da frequência cardíaca
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melhor recuperação após doença
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melhor atenção, concentração e foco
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mais massa cinzenta no cérebro
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mais criatividade
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redução de estados depressivos e prevenção de recaídas
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melhor digestão e perda de peso
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melhor sono
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maior bem estar
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abrandamento do envelhecimento cerebral
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distanciamento dos próprios pensamentos
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melhor vida sexual
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maior capacidade de agir em consciência
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melhoria na relação com os outros
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experiência da parentalidade mais satisfatória
Talvez já tenhas explorado o tema do Mindfulness com o intuito de ganhar algum benefício. Normalmente, existe algo que nos leva até a prática. O desejo de se sentir menos ansioso (como no meu caso), a vontade de aumentar a atenção, a necessidade de lidar com uma doença, o desejo de ser uma mãe mais calma…
Foi só quando eu deixei ir a enorme vontade de sentir mais tranquilidade e menos ansiedade que conseguia respirar direito enquanto meditava. Até lá a minha respiração ficava ”presa”, sentia-me asmática.
Seja qual for a tua razão, quero-te fazer um convite. Agradece a razão que te trouxe até aqui e deixa-a ir. Deixa ir também todas as ideias sobre o que possa estar efetivamente a acontecer no teu cérebro, e no teu ser. Entrega-te a prática de Mindfulness pela prática em si. Mais nada. O desejo de obter um certo resultado impede o verdadeiro ”resultado”, a verdadeira descoberta. Quando temos algo em específico em mente tendemos a avaliar a experiência à luz desse desejo. Tal como eu fazia. A meditação não funcionava pois eu continuava a sentir-me ansiosa. E tenho visto muita gente a desistir da prática assim.
Sê generosa ou generoso, ou seja, pratica sem esperar nada em troca e observa o que acontece.
Nas palavras de Albert Camus:
”A verdadeira generosidade para com o futuro consiste em dar tudo ao presente.”
E assim, já começaste a tua prática!
Aqui vai uma sugestão de prática que podes utilizar nos próximos dias:
STOP (pausa consciente):
S – Stop: para imediatamente o que estás a fazer, se for necessário, afasta-te da situação.
T – Toma um momento para respirar! Foca-te na tua respiração. Observa três ciclos inspirando e expirando.
O – Observa o que está a acontecer em ti, sem julgamentos e com compaixão. O que sentes? Quais as tuas necessidades neste momento? O que identificas como difícil, preocupante ou intolerável?
P – Procede com a situação. Com tranquilidade e sem julgamentos comunica o que tens a comunicar. Faz o que tens a fazer.