Academia de Parentalidade Consciente

20 anos depois, a carta que gostava de receber dos meus ex-alunos!

de Sara Gonçalves

Se daqui a 20 anos recebesse uma carta do grupo de crianças que tenho neste momento em sala, gostaria muito que fossem estas as suas palavras!

Obrigada por nos terem permitido ser quem éramos, por tentarem ao máximo RESPEITAR A NOSSA ESSÊNCIA mesmo havendo tantas diferenças nas nossas necessidades, níveis e ritmos de desenvolvimento.

Obrigada por se esforçarem em VER PARA ALÉM DO NOSSO COMPORTAMENTO, mesmo quando muitas vezes quase que parecia indecifrável o que estávamos a querer transmitir! Nestes casos, a vossa disponibilidade, paciência e abertura foram essenciais para chegarem lá, para reconhecerem se precisávamos de maior conexão, de mais segurança, de experiências diferentes ou de nos sentirmos reconhecidos.

Obrigada por ACOLHEREM AS NOSSAS EMOÇÕES mais desafiantes, mais intensas e mais explosivas, que nos deixavam completamente fora do controlo e a precisarmos da vossa mão, do vosso olhar e do vosso colo, enfim, da vossa presença consciente perto de nós.

Obrigada por nos terem desafiado, por ACREDITAREM e CONFIAREM que conseguíamos ir mais além e que, ainda assim, se nós demonstrássemos medo ou insegurança, estavam lá para nos apoiar e ajudar a lidar e a aceitar todas as nossas emoções.

Obrigada pela vossa FLEXIBILIDADE e por deixarem de lado a crença de que se fizerem uma coisa de uma maneira num dia vão ter de fazer obrigatoriamente igual no outro porque nos vamos habituar “mal” e vamos querer que seja sempre assim. Foi tão importante para nós podermos adormecer ao colo quando era isso que precisávamos (mesmo com 30 meses, alguns de nós ainda necessitamos desses momentos tão importantes de ligação), de “conchinha”, de mão dada ou, simplesmente, com um beijinho e um “dorme bem”.

Obrigada por nos darem a CONHECER os vossos LIMITES, foi importante para também nós conhecermos e exprimirmos os nossos e aprendermos a respeitar os vossos.

Obrigada por acreditarem que É POSSÍVEL FAZER DIFERENTE e, com isso, nos darem a conhecer um mundo de possibilidades e de verdade quando lutamos por aquilo que nos vai no coração sem nunca perdermos a capacidade de sonhar.

Obrigada por RESPEITAREM AS VOSSAS PRÓPRIAS EMOÇÕES, fazendo-nos ver que as nossas emoções sejam elas quais forem são válidas e devem ser acolhidas por nós com amor, compaixão e respeito.

Obrigada pelas ENTREGA e PRESENÇA nas nossas brincadeiras, pelas palhaçadas, pelos risos, pelas viagens ao mundo da fantasia, pelas danças infantis e pelas kizombadas, tão bom que foi sentir que a nossa cultura era valorizada.

Obrigada por nos ajudarem a LIDAR COM OS CONFLITOS de uma forma empática e sem julgamentos, dando-nos a oportunidade e o poder de escolha na solução dos mesmos.

Obrigada pelos “NÃO” que não nos disseram E QUE TRANSFORMARAM EM “SIM” ao que vocês queriam. Fez toda a diferença substituírem o “Não mexas aí” ou o “não subas para cima dos móveis” pelo “Tira a mão” ou “Coloca os pés no chão”. Para nós, tão pequeninos, é muito mais fácil quando a mensagem que nos transmitem corresponde ao que querem de nós sem o uso excessivo do “não”.

Obrigada por nos permitirem vivenciar os momentos da refeição de forma tranquila e por se esforçarem por DIFERENCIAR os nossos DESEJOS de NECESSIDADES. Sabemos que nem sempre foi fácil! Gerir um grupo de crianças à mesa é desafiante e, por vezes, requer uma boa dose de imaginação e criatividade.

Obrigada por utilizarem uma COMUNICAÇÃO CONSCIENTE connosco. De facto, para crianças tão pequenas como nós éramos, o reconhecimento foi uma ferramenta fundamental quando o que pretendiam era apoiar, promover e desenvolver competências ao nível da comunicação, da autoestima e da responsabilidade pessoal.

Obrigada por se PERMITIREM SER IMPERFEITAS e por se esforçarem por controlar o desejo da perfeição (vossa e nossa).

OBRIGADA POR TRABALHAREM COM AMOR E COM PAIXÃO PELA PROFISSÃO!

E, se são estas as palavras que eu gostaria de ler daqui a 20 anos do trabalho que é desenvolvido em sala, temos de PARAR e REFLETIR no AGORA! Refletir e questionar-me se estou, e se estamos enquanto equipa, de facto, a caminhar nesse sentido. Se aquilo que queremos receber está em concordância com aquilo que estamos a dar. Só assim fará sentido, e só assim poderei algum dia almejar receber uma carta destas!