Academia de Parentalidade Consciente

Carta Aberta à Patrícia (uma mãe como Tu e Eu)

Querida Patrícia,

Antes de mais, aqui fica um abraço, um a b r a ç o demorado, inteiro, caloroso e cheio de muita compaixão.

Gostei de si e da sua filha que, deixe-me que lhe diga, não é nenhuma tirana.

É apenas uma MENINA, como os meus filhos. É reguila, esperta, com vontade própria, com gostos, com medos e sonhos, com alegria e vida dentro dela.

Por favor diga EU neste post quem tem filhos que : não querem ir para o banho, não querem sair do banho, não querem a sopa, não querem ir dormir, não querem apagar a TV, saltam no sofá, provocam com palavras ou atitudes, CHORAM e resistem? Diga EU quem tem filhos que não se querem vestir, não se querem pentear, não querem lavar os dentes, ficam horas demais na escola e “pioram” na presença dos avós? Quem tem filhos que pedem doces a toda a hora, não querem adormecer sozinhos ou no escuro, que não querem dar beijinhos e muito menos pôr a mesa?

E a Patrícia, uma mãe como eu: cansada, cheia de amor para dar, a fazer o melhor que pode, exausta alguns dias, agradecida outros, sozinha a decidir mil coisas, com falta de tempo para si, perdida às vezes, uma mãe que cuida, grita, mima, alimenta, e não sabe o que fazer a tantas inquietações, à  vida que nos atropela, ao tempo que passa depressa demais.

Só lhe queria dizer que não acredite em nada do que essa “Super Nanny” disse. Tire os quadros das estrelinhas e o porco das recompensas, as relações não se fazem disso, querida Patrícia, e é isso que EDUCAR é: ensinar o que é um relacionamento (entre pessoas, consigo própria, com o resto do mundo).

E é só isto que a sua menina-perfeita lhe está a dizer, com muita sabedoria: “Olha para mim sem ser para me corrigir, Mãe. Gostas de mim como eu sou? Permites que eu cresça a ter a minha opinião, o meu espaço como pessoa, aqui em casa? Dás-me o respeito que achas que te faltou? Conversas comigo sobre como eu me sinto? Saltas comigo no sofá um bocadinho? Não me abandonas nos momentos escuros da vida?”

Ela só quer saber como se faz, como se vive, como se lida com a dor, o desconforto e quer mostrar-nos, querida Patrícia, que quer da vida a Alegria, não o sacrificio, que é forte, não uma vítima das circunstâncias, que quer conhecer a sua mãe, de verdade, que gosta de si mesmo como é!

Dê-lhe, então, espaço para ser quem ela é, peça-lhe por favor e agradeça-lhe, ajude no que puder para que os seus dias de infância sejam felizes, pergunte-lhe como serve melhor para ela a cada obrigação ou rotina, deixe-a decidir quanto (não o que) quer comer, deixe decidir se tem sono (não como adormecer) , coloque os seus limites – aqueles que entenda que são benéficos para a saúde dela, o bem estar dela, o saudável desenvolvimento dela –  com firmeza, muito amor e paciência. É só  disto que as crianças precisam e é esta a receita que as tornará adultos mais pacíficos, seguros de si.

Deixe-a vestir o que ela gosta, decidir se tem frio ou calor, pentear o seu próprio cabelo, gerir os seus deveres escolares – que perigo pode vir daí? Peça-lhe opinião sobre o que  a Patrícia vai vestir, como usa o cabelo ou a ementa da semana e verá os olhos dela a brilhar e as birras a apagarem-se. É assim que as crianças se transformam em adultos com responsabilidade e auto-estima.

Querida Patrícia, não a rotule, não lhe bata, não a ameace – relacione-se com ela como gosta que se relacionem consigo. E não espere que ela mude como por milagre –  confie que as crianças são seres em desenvolvimento, não pequenos adultos em miniatura.

O exemplo não é uma forma de educar, é a única. E nunca lhe retire amor, nunca lhe retire a sua Presença, o seu carinho, sobretudo quando é preciso ir contra o seu desejo, a sua vontade ou o seu comportamento.

Todo o comportamento tem uma necessidade para ser satisfeita por trás – o que quer a sua menina-perfeita, Patrícia? O que está ela a dizer? Do que precisa ela da Mãe?

É em si que reside a solução deste enigma e da mudança da vossa relação (como em qualquer outro pai ou mãe, é este o poder maior que temos como adultos!)

Querida Patrícia, queria  só agradecer-lhe pela coragem de expor as dores de todas nós, de nos “obrigar” a falar disto, porque, na verdade, somos todas “mães solteiras”, num dado momento do percurso, em algumas paragens do caminho. Recaiem sobre nós a responsabilidade, a culpa, as decisões, a gestão doméstica e emocional – é assim que as coisas são, ainda, neste País.

Talvez quando a sua menina for mulher as coisas tenha já alterado um pouco. Talvez nenhum pai possa sair da vida dos filhos, como tantos saem (alguns deles mantendo-se em casa!). Talvez, se educarmos esta geração de forma diferente: promovendo o igual valor, a responsabilidade pessoal e o respeito pelo integridade de cada ser humano.

Talvez quando a tua menina for uma mulher, a igualdade tenha finalmente em conta as diferenças. Talvez nos permitam ficar com as nossas crianças em casa até aos 3. E trabalhar em tempo parcial ganhando um salário que dá para viver, até aos 12, para que os possamos realmente acompanhar com tempo e qualidade.Talvez haja uma real rede de suporte de amas, nannys, espaços de apoio às mães mais sozinhas e esta “Super Nanny” fique sem emprego.

Por mim, já a sentei, desde o meio do programa de ontem, no banco do pensar. Acho que ela precisa muito de pensar. Ora, fazendo as contas à  sua idade , talvez 55, 60 minutos…ou seriam 60 horas? Ou talvez melhor 60 dias? Por mim, querida Patrícia, deixo-a lá para sempre.

da facilitadora,

mariana bacelar

P.s: A Carta à Patrícia foi escrita com base nos factos apresentados no programa.

11 comments

  1. Boa noite Msrisna! Obg pelo texto magnifico em que ne revejo completamente. Tenho 2 filhas que amo incondicionalmente, mad que tb me esgotam, me irritam, me provocam e me amam. Ser mãe e ser filho/a não tem guião, portanto temos de ir vivendo, de nos irmos adaptando. Às vezes nós sabermos que não estsmos sózinhas. Mais uma vez obg.Beijinhos

  2. Eu conheço uma mãe com uma filha igual à da Patricia, aplicou o castigo do banco mas n adiantou pelo contrário piorou. Ela está desesperada pois n sabe o k mais fazer

  3. Mariana, muito obrigada em meu nome por esta carta tão bonita a uma mãe como todas nós, aflita, e a tentar dar o seu melhor! Um beijinho e força para nós.

  4. Subscrevo na totalidade…..sei que há quem não pense assim, mas esta é a minha maneira de ver a maternidade. Sem rótulos, sem o “porque sim”, sem “sou eu que escolho o que vestes”….sem recriminar…..
    nunca tive que pôr as minhas filhas a pensar….1 minuto por cada ano? Há teorias para educar uma criança?
    nunca consegui deixar as minhas filhas a chorar na cama quando eram bebés….habituas mal….era o que eu ouvia……peguei sempre nelas…..embalei sempre, senti o cheirinho….e quis parar aqueles momentos para sempre (não consegui!!!!!!!!!)
    Vou contra tudo o que me ensinaram que era correto, se eu sentir que não faz sentido.
    Sei que na correria do dia a dia o mais fácil é castigar, é gritar (e às vezes sai mesmo o grito), mas tento não me deixar levar…..se nos mantermos focadas ali, nelas, no momento, conseguimos perceber os problemas, entender e descomplicar.
    O problema não está, muitas vezes (na maioria das vezes) nas crianças. Está na nossa vida….nos nossos horários….nas pressões que temos, nos prazos….e transportamos tudo isso conosco e quem paga é sempre “o elo mais fraco”.
    Deviamos conseguir parar….abrandar o ritmo, tudo iria funcionar melhor.

    acho horrível exporem assim uma criança, quando ela é apenas isso: uma criança. Faz birras? levante a mão que não faz! Amua? Quem não amua?

  5. Uau. Nao poderia ter descrito melhor. Tao poderoso. Sem criticas e julgamentos. Apenas a compreensao de quem compreende as dificuldades desta mae. Esta

  6. Parabéns, Mariana! Por ir contra a corrente, por não ser “um boi seguindo a boiada” entre tantas críticas à mãe e ao programa, vc conseguiu ter um olhar diferenciado pra essa mãe, que grita por socorro. Pq talvez tenha sido o desespero que a levou a expor sua filha assim. Porém, vc não a julgou, ao contrário, pegou-a no colo, como ela deveria fazer à filha. E disse, “somos humanas, todas erramos, mas olhe, tente fazer diferente”.
    Obrigada pelo lindo texto! Bela reflexão pra quem procura ser a cada dia uma mãe melhor!

  7. Obrigada por esta carta.
    Levanto a mão, eu e os meus filhos também temos essas atitudes.
    O caminho é da aprendizagem mútua, esse é o desafio de sermos mãe, pai, cuidador,…
    Para mim o maior propósito para termos filhos não é regenerar a humanidade mas sim a evolução em termos de consciencialização da humanidade, hoje sou uma pessoa mais consciente em relação às minhas necessidades e às dos meus filhos, do meu marido,… e como isso se demonstra em atitudes, que nem sempre são as mais desejáveis. E relação a isso “Está tudo bem” como diz a Mikaela Övén, faço o melhor com os recursos (emocionais) que tenho no momento. A minha intenção é para a próxima fazer diferente para ter resultados diferentes, é ter as atitudes que gosto que tenham comigo.

  8. eu também exagerado algumas atitudes da Nany…não julgo, ou tento não julgar toda esta situação, esta mãe pediu ajuda,..e está a tentar fazer o que pode…mas eu sinto que tem de vir de dentro,…ela tem de fazer o que sente…talvez dizer à filha abertamente o que sente sem capas…e as duas construírem uma relação….sem estar preocupada com o que diz a sociedade..Acredito que a Nany fez o melhor que sabe..mas sinceramente não sei se é por aí o caminho…! ás vezes penso…e se nos colocássemos no lugar da criança…ou mesmo fazer o jogo de inverter os papeis…beijocas e sejam felizes!!!

  9. Eu! Quantas vezes já me senti como a Patrícia, cansada, esgotada, sem conseguir ver a luz ao fundo do túnel. Temos de ir um dia de cada vez, tentando nos adaptar a cada situação, a cada momento. Não há receitas. Fazemos o melhor que sabemos e conseguimos.
    Força para todas nós. Adorei o texto. Obrigada

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