Academia de Parentalidade Consciente

“Espelho meu, espelho meu” – O melhor exercício para levar na mala da maternidade

A gravidez é, provavelmente, o período de maior transição e adaptação da vida da mulher, do casal e da família. Para a mãe, implica grandes alterações biológicas, cognitivas, emocionais e sociais.

parou para pensar sobre isto? Sobre o que é necessário para todos estes processos terem lugar? Para ter lugar a maternidade e a paternidade? Como o corpo da mãe se altera, como os órgãos mudam de posição para dar espaço ao bebé, como as hormonas comunicam e afectam estados emocionais… No próprio investimento emocional que é necessário para assegurar a saúde, segurança e bem-estar do bebé in-utero? Como nos questionamos acerca de assuntos sobre os quais nunca tínhamos reflectido, como passamos a olhar e a experienciar determinadas situações de outras formas…? Os pensamentos e emoções surgem, por vezes, de forma intensa. Frequentemente, sentimos a invadir-nos e não sabemos como lidar com eles. Chegam a ser assustadores e ambivalentes: “Eu quero este bebé mas não quero.”, “Será que vou ser boa mãe?”, “O que é que eu fui fazer?!”, “Sinto-me triste e isto afinal não é nada do que eu estava à espera”, “Estou zangada e nem sei bem porquê!”. Como Mães, como Mulheres, olhamos ao espelho e vemos, não só fisicamente, todas estas mudanças a acontecerem.

[perfectpullquote align=”full” cite=”” link=”” color=”” class=”” size=””]É uma experiência única e intensa de reorganização e readaptação a si mesma, aos outros e ao mundo à sua volta. E tem tanto de maravilhosa e iluminada como de assustadora e confusa. [/perfectpullquote]

Super-pais?

A par com estas transições tão exigentes, ainda sentimos frequentemente pressão da sociedade, dos media, da vizinha e da colega para sermos perfeitas e mantermos todas as áreas da vida em “perfeito estado”. Impecáveis. Tem de estar tudo impecável: a casa, o corpo, as relações, os outros filhos, a comida, o trabalho… Caso contrário, é sinal de que não estamos a ser suficientes e que nos falta qualquer coisa. Mas só a ideia de que sou capaz de manter todas as áreas da minha vida em perfeito estado já é, só por si, muito subjetiva. Sem dúvida que será diferente para mim do que é para a vizinha, para si, ou para a colega de trabalho. E se acha que há quem consiga “dar conta do recado” na perfeição, pense novamente: Primeiro porque, muitas vezes, a vizinha do lado não está a dizer tudo, tem receio (como nós) de mostrar as suas fragilidades e também não consegue gerir todas as áreas da vida de forma brilhante e está a passar exatamente pelo mesmo. Segundo porque, mesmo que seja possível, ela tem uma Vida e nós temos outra. Esqueça as comparações com a colega do lado, se foi capaz de trabalhar até às 40 semanas ou se voltou ao trabalho 2 meses após o parto – todas sentimos na pele o sofrimento que as comparações podem trazer. [perfectpullquote align=”full” cite=”” link=”” color=”” class=”” size=””]Somos todas super-mães, não por sermos perfeitas ou por andarmos constantemente em busca da perfeição. Somos super-mães por sermos seres humanos e, por isso, cada um de nós é verdadeiramente único e especial. Somos super-mães porque somos capazes de gerar, nutrir, criar um outro super-ser.[/perfectpullquote]

E somos “perfeitos nas nossas imperfeições”, como diria a Mikaela Övén.

Tenho-me cruzado com muitos pais, em consultas, workshops ou conversas informais, que trazem consigo esta pressão da perfeição, esta sensação de “insuficiência”. Eu própria descobri cedo esta pressão que fazia a mim mesma, manifestada primeiro por sintomas físicos. Com 12 anos, já ficava com tremendas dores de estômago na altura dos testes. E desde essa altura que aprendi muito com esta pressão! Confesso que, durante vários anos e até recentemente, balancei entre a necessidade de fugir deste perfeccionismo e grande exigência, porque me trazia imenso sofrimento, e a ideia de que era isto que me ajudava a alcançar as metas que traçava, o sucesso que fui atingindo. Até que percebi que precisava de parar, encarar, conversar, entender a mensagem e fazer as pazes. Sobretudo comigo. Porque isto implica uma guerra aberta connosco mesmas, constantemente a pensar no que não somos capazes, de que não somos suficientes, de que falta qualquer coisa. Mas afinal, o que me ajuda a alcançar o que tenho vindo a alcançar é a minha determinação e paixão, o perfeccionismo prende-me e não me permite avançar.  E ainda estou nesse processo, a diferença é na forma como lido comigo, na atitude que tenho nos diálogos internos  🙂

O que pergunto quando me olho ao espelho?

Que atitude trazemos, então, para nós mesmas? Como nos tratamos? Além da pressão externa, também nos pressionamos por não sermos perfeitas, achamo-nos insuficientes? Que diálogo temos connosco? Julgamo-nos constantemente? Ou tratamo-nos com compaixão? Aproveitamos para nos questionarmos “o que posso então fazer com isto”? Como faríamos com a nossa melhor amiga, se estivesse na mesma situação que nós? Mostraríamos compaixão ou julgaríamos? O que a ajudaria mais? Porque não o fazemos connosco?

E mais: confio em mim? Confio que sou capaz? As pressões externas frequentemente afastam-nos da nossa capacidade de confiar. No meu corpo, na sua sabedoria, no bebé. E confiar que cada coisa tem o seu tempo. O início do trabalho de parto tem o seu tempo, o próprio parto tem o seu tempo. Salvo algumas excepções (e, segundo a evidência, são mesmo excepções, felizmente), a natureza é sábia e estamos desenhados de forma extremamente inteligente para estas fases. Se pesquisar em alguns sites como os referidos no artigo anterior vai encontrar bastante evidência a este propósito. E, no caso das excepções, quando a natureza não o permite, podemos procurar ter connosco pessoas que nos permitam vivenciar esta experiência de forma alinhada com as nossas intenções, já que são momentos que nunca esqueceremos.

Portanto, chegamos à gravidez com uma bagagem às vezes mais “pesada” que a própria gravidez. E esta pressão que continuamos a exercer uns aos outros só nos afasta do que é realmente importante. Então…

O que é realmente importante para mim?

No artigo anterior, falei sobre três itens que me parecem essenciais para levar na mala da maternidade. Um deles é o Espaço. Pessoalmente (e a ciência tem estudos fantásticos sobre isto), considero o mindfulness uma óptima ferramenta para encontrarmos este espaço e cuidarmos de nós. Para nos reencontrarmos neste novo papel como mães, com a tal bagagem que já trazemos connosco; para respondermos a esta e outras perguntas que vão surgindo. [perfectpullquote align=”full” cite=”” link=”” color=”” class=”” size=””]Alguns estudos demonstram que a prática de mindfulness na gravidez pode reduzir o stress, alguns sintomas depressivos, e até proteger o bebé de perturbações de desenvolvimento. [/perfectpullquote]
Podemos, então, praticar mindfulness de forma mais formal, isto é, podemos sentar-nos a meditar, ou de forma informal, colocando a nossa atenção em qualquer ação do dia-a-dia (como escovar os dentes ou andar a caminho do trabalho), sem julgamentos, apenas observando com curiosidade. E estas práticas podem ajudar-nos a ouvirmos o que realmente queremos para nós, para a nossa família, que necessidades podemos ter em falta, de que forma nos relacionamos connosco e com os outros. Para isso, não é necessário ter prática prévia, ser “zen” ou fazer uma viagem ao Tibete (Pode encontrar aqui um breve artigo sobre mindfulness )

Portanto, escolha uma prática, seja a meditação mais formal ou uma atividade qualquer num momento do seu dia e, durante a prática que escolheu, experimente observar o que está a acontecer no momento, sem avaliar ou julgar. Pode até experimentar o exercício enquanto lê este artigo.

Primeiro, tome consciência das sensações físicas, o que está a sentir no seu corpo neste momento. Pode experimentar dizer “Ok, estou a sentir a água fria dentro da boca” ou “sinto um formigueiro no pé esquerdo” ou “Estou a sentir desconforto na zona lombar” ou “Reparo que sinto tensão no pescoço”. Qualquer sensação que esteja a sentir, apenas observe com curiosidade.

De seguida, pode experimentar identificar que emoções estão presentes (“estou a sentir tédio”, “estou a sentir ansiedade”, “estou a sentir medo”). A ideia não é afastá-las, apenas observar o que está a acontecer, neste momento. Como se está a sentir?

Às vezes descobrimos simplesmente que é assustador parar. “E está tudo bem”! Só o facto de descobrir que tem medo de parar, implica que já observou que emoção está presente. E isso quer dizer que já parou, mesmo que por segundos 🙂

Depois, experimente identificar que pensamentos surgem. Se são pensamentos mais ligados a autoavaliações, a julgamentos (“não posso sentir-me assim”, “não devia pensar isto”), se são pensamentos mais catastróficos (“nunca vou conseguir”). Já reparou que é tão comum termos este tipo de pensamentos, nas mais variadas situações? E já reparou como este tipo de pensamentos têm impacto, por sua vez, no nosso corpo e nas nossas emoções? Se nos limitarmos apenas a observar os pensamentos, fazemos uma pausa nesta “pescadinha de rabo na boca”. Pessoalmente, gosto muito e tenho utilizado frequentemente a frase: “Eu não sou os meus pensamentos”, que acho profundamente libertadora. A verdade é essa, nós não somos os nossos pensamentos, eles não nos definem e nós não temos de fazer nada com eles, podemos simplesmente observá-los e deixá-los ir, como nuvens a passar no céu.

Lembre-se de observar com curiosidade tudo o que possa surgir e de praticar auto-compaixão sempre que não realizar a atividade, por algum motivo.

Pode experimentar alargar esta prática para vários momentos ao longo do seu dia, por exemplo, identificando o que o faz sentir-se mais ansioso, zangado, que situações são mais potenciadoras de stress, refletindo sobre eventuais estratégias para alterar a forma como lida com algumas situações específicas. Ou até evitá-las, se necessário.

Esta prática pode ser muito útil durante toda a gravidez, no parto e no pós-parto. Pode treinar esta observação das sensações físicas que possam estar presentes durante a gravidez (como os típicos desconfortos) e levar este treino para o parto (nomeadamente aplicando a observação às contracções) e o pós-parto (aplicando esta observação durante a amamentação). Observando com curiosidade sensações, emoções e pensamentos que poderão estar presentes, cria espaço entre o que sente/pensa e como escolhe agir. Aceitando, vê as coisas como são e faz as pazes com o que quer que possa surgir, em vez de resistir ao que está a acontecer. Lembre-se que resistência gera mais resistência. É a aceitação do que está a acontecer neste momento que abre o leque de possibilidades para agir (Resistência seria, por exemplo, pensar “Não me posso sentir triste”, e aceitação será, por exemplo “Ok, estou a sentir tristeza. Porque será que estou a senti-la?” e, eventualmente, “O que posso fazer?”).

Cada momento da gravidez é único, cada experiência acontece uma única vez. Se não estivermos presentes, vamos ter ainda mais a sensação de que “passa tão rápido”. No parto, cada contração é única. No pós-parto, cada mamada é única, cada choro é único, acontecem a primeira e última vez. Nenhum momento vai durar para sempre (mesmo que pareça, como quando sorriem para nós 🙂 ). Cada momento vem, fica um pouco e passa. Também os momentos desafiantes surgem e passam. Como quando estamos exaustas e o bebé não pára de chorar… Vai passar.

E a melhor forma de garantir que não “passa tão rápido” é estando presente e consciente, sempre que possível, com estas atitudes e com as intenções bem definidas.

Aguardo as vossas partilhas, experiências e como se sentiram com estas práticas, no meu facebook ou na zona dos comentários aqui no blog.

Jordana Cardoso

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