Academia de Parentalidade Consciente

Cuidar dos cuidadores, a primeira regra em estados de emergência!

Ser mãe sempre foi sentido por mim com sentido de missão. Lembro-me de ser pequena, 11/12 anos, e de querer ser mãe. Mais tarde, acrescentei especificações à intenção: queria ter cinco filhos. Imaginava como seria divertido ter uma casa cheia de alegria, como seria divertido partilhar a diversão, a aprendizagem, as aventuras, as cantorias. Imaginei-me a viver no campo, numa casa grande com uma mesa comprida onde tomaríamos refeições animadas, em família. Criei um cenário perfeito na minha cabeça.

Acabei por ficar a meio caminho entre não ter filhos e ter cinco. Acreditava que amor era tudo o que seria necessário para os acompanhar na sua aventura do crescimento e na construção do filme que tinha criado na minha cabeça. A realidade revelou-se bem diferente do que tinha planeado, por circunstâncias diversas e que estavam fora do meu controlo.

Chegou uma fase em que o que eu sabia sobre amor já não era suficiente para lidar sozinha com as necessidades de três crianças pequenas e, a pouco e pouco, cerca de quatro anos e meio depois de ter tido o primeiro dos meus filhos, na altura em que tive o último, o caos instalou-se. Quando falava com a minha filha mais velha e lhe estava a dar atenção, o do meio acordava e tinha de lhe dar atenção para de novo ser interrompida pelo mais novo, que tinha fome ou precisava de mudar a fralda. E o tempo ia correndo ao sabor de emergências e de poucos intervalos de foco pleno no que estava a acontecer e que apenas acontecia entre o meu regresso do trabalho e a saída, de manhã, para levar as crianças ao infantário. O resto do dia era passado a trabalhar focada na perfeição e na eficiência, para poder sair o mais cedo possível e de novo chegar e sentir que era engolida por um furacão.

Tomei então consciência, pela primeira vez, de que não era competente na tarefa de ser mãe, pelo menos da forma como sonhara.

Quando os meus filhos eram pequenos, dizia com frequência que não tinha qualquer influência de gestão sobre a minha vida, pois era ela que me geria, completamente, a mim. Deixei de sentir a individualidade de cada dia. O tempo era uma sucessão infindável de urgências, avassaladora, impiedosa e que fundiu a minha identidade com o meu comportamento, traduzindo-se numa reação básica a estímulos externos. Tinha deixado de ser mãe para ser essencialmente “bombeira”.

A relação amorosa entre nós os quatro, em casa, sempre foi muito forte e visível para todos quantos conviviam connosco, mas em casa a situação era desafiante. A falta de limites e a minha dificuldade para identificar a sua necessidade dificultou o processo de ter uma casa tranquila. A agitação era uma constante.

Havia permanentemente alguém a dizer: “mãe, isto”, “mãe, aquilo” e, de cada vez que ouvia um “mãe…” sentia como se estivesse a ser agredida fisicamente, pois não conseguia satisfazer todas as chamadas.

O sentimento de culpa que então sentia agigantava-se, por não conseguir ser um modelo de calma e de tranquilidade, ao mesmo tempo que brincava e cantava e dançava com os meus filhos e inventava brincadeiras criativas e estimulantes e geria as horas das refeições e as próprias refeições e as horas de ir para a cama e começava a gritar, impacientar-me e a ficar zangada porque perdia o controlo no meio da agenda infindável de tarefas que eu achava serem indispensáveis para se ser uma boa mãe.

A crença de que o papel de mãe tem uma “agenda” obrigatória a cumprir para se chegar ao pódio das boas mães foi muito limitadora. Eu tinha a crença de que, para além de dar amor, incondicionalmente, garantir a sobrevivência, entregar liberdade, tinha de ser uma espécie de artista de variedades sempre pronta a actuar em qualquer disciplina do espectáculo. A verdade é que me divertia imenso nas actuações (literalmente), mas a forma como levei isto a cabo transformou esta crença numa obrigação e a obrigação numa actividade muito stressante, pois ser mãe de três sozinha e sem agência de produção associada era demasiado pesado para mim. Era um projecto megalómano que me esvaiu a energia aos poucos e me foi transformando na mãe que não queria ser, a mãe que perdia a paciência.

Percebi que era necessário tomar medidas sérias e congruentes. Baseei-me na técnica de assistência a catástrofes em estados de emergência, ou seja: em primeiro lugar garante-se a sobrevivência de quem melhor pode assegurar a sobrevivência de outros, no caso, eu.

Apercebi-me de que dormir mais de 4 horas por dia era urgente. Como não conseguia arranjar horas adicionais, procurei uma alternativa ao sono. Encontrei a meditação e o yoga. Com uma prática de 20 minutos de meditação, duas vezes ao dia, eliminei a carência imediata de sono. Fiz isto disciplinadamente durante cerca de três anos. Depois, as crianças começaram a crescer e passei a ter mais tempo disponível para dormir e indisciplinei-me. Continuo a meditar esporadicamente. Agitação mental, não voltei a ter, nem engarrafamentos mentais de pensamentos. Foi um contributo muito valioso para a paciência.

Aceitei que era a melhor mãe que conseguia ser. Percebi que era possível melhorar e que em cada momento seria, apenas, tão boa como podia ser. Percebi que ser o que se é, é suficiente se o aceitarmos sem julgamentos e com tranquilidade, criando espaço para colocar o foco em quem queremos ser.

A aceitação, quando plenamente exercida, é uma aula de autoestima que entregamos aos nossos filhos.

A tomada de consciência de que era necessário existir congruência na minha actuação foi determinante para finalmente escolher um rumo definido.

Comecei a perceber o que fazia e o que não fazia sentido introduzir na nossa casa e o que era confortável e exequível, sabendo que não ia ser imediato o resultado.

Hoje sei que a criação de expectativas é uma limitação que nos impomos. A realidade surpreende-nos sempre. Criando expectativas, perdemos a possibilidade de viver plenamente o presente, que nunca acontece como no guião, e desvia-nos do maravilhamento do principiante.

Aprendi também que não sabia, aliás não fazia ideia, do que era apenas usar o amor para ajudar crianças a crescer. Fui fazendo acrescentos às minhas convicções sobre a maternidade. Fui fazendo alterações na forma como tentava gerir o inesperado, porque na realidade não estava a viver de acordo com um guião, mas sim a fazer um guião.

Hoje, continuo a escrever o guião, a cada dia, a cada momento. Sei que quanto menos expectativas tiver, maior é o potencial de felicidade em cada momento. Sei que existe uma espécie de ordem universal segundo a qual posso crescer com a minha família.

Na minha evolução como mãe foi fundamental perceber a importância do exemplo na educação a dar às nossas crianças, considerando que serão adultos e que incorporarão as suas aprendizagens e experiências. A forma como nos respeitamos e aos nossos limites é um dos melhores ensinamentos que podemos entregar aos nossos filhos. O mesmo valor atribuo à não aceitação do não respeito a nós por parte das pessoas com quem nos cruzamos.

O processo ainda não acabou, nem acabará nunca, tal como a vida. Sei que faço o melhor que sei e que o meu foco está nas nossas necessidades e na sua interpretação para da forma mais ecológica a todos satisfazer.

Se pudesse voltar atrás teria começado a cuidar de mim mais cedo para que nunca tivesse ficado tão frágil. Teria sido menos exigente comigo e mais confiante no equilíbrio que surge quando nos entregamos sem resistência e sem julgamento às experiências diárias.

Neste momento, cerca de dez anos depois de ter iniciado este caminho conscientemente, continuo a manter o foco no alinhamento das minhas opções. Sei que se quebro este foco fico impaciente, resisto e deixo de seguir o caminho do menor esforço.

Tenho consciência de que para os meus filhos é muito importante sentirem-me alinhada. Estamos a construir um caminho de que todos gostamos. Conversamos sobre as necessidades e dificuldades que vamos tendo. Conhecendo cada fragilidade, temos a tarefa facilitada. Aceitamos, reconhecemos, mudamos e crescemos em conjunto.

Estamos no bom caminho!

Maria José Pita

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2 comments

  1. Grata! Esta foi a melhor prenda que recebi hoje! Identifiquei-me, senti-me compreendida, que tenho feito o melhor que sabia, mas que a aceitaçäo disso e respeitar os meus limites, arranjar momentos para mim será imprtante, produtivo, trará mais alegria e satisfaçäo e mais qualidade ao meu corpo, à mi ha mente, à minha vida, à dos meus filhos no hoje e no futuro. Grata. Gostaria de poder contar com a sua ajuda neste processo de crescimento e autoconhecimento. Ida

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